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Este espaço se destina ao estudo, problematização e elaboração dos Formadores do Programa de Formação Continuada de Professores - ECOAR (Elaborando Conhecimento para Aprender a Reconstruí-lo)
Festança na floresta
Clarice Lispector*
Estamos no mês de junho, as fogueiras de São João se cendem, balões sobem, já há friozinho e aconchego. Dá para comer batata-doce à meia-noite com café tinindo de quente.
Mas me disseram que a festa não é só nossa. Pois não é que ia haver uma festa da bicharada na selva? E calculei que isso acontecesse no mês de nossos próprios folguedos. Pelo
menos é o que garantem os índios da tribo Tembé.
Foi assim: os animais das matas até que estavam ocupados e calmos em relação a seus deveres, pois o dever do animal é existir. Mas eis senão quando surgiu no ar um boato que
logo se espalhou alvissareiro num diz-que-diz assanhado. Vinha esse boato trazido pelo canto do sabiá. Como o sabiá, a quanto se sabe, canta pelo mero prazer de cantar, ficaram os bichos em dúvida sobre se era ou não verdade.
E – de repente – começou a chover convite para a tal festança. Quem convidava não dizia quem era, mas todos desconfiaram que a idéia vinha da rainha das selvas brasileiras, a onça, mandachuva que era. Todos os bichos foram convidados, garantindo-se que na ocasião seria abolida a ferocidade. Até a mãe-coruja, que de tão séria e sábia até óculos usava, foi
convidada com seus filhotes.
Quanto às filhas do macaco, doidas para namorar e enfim casar, enfeitaram-se tanto e com tantas bugigangas que pareciam umas – é isso mesmo, pareciam umas verdadeiras macacas.
E quem pensa que a cobra faltou por ser tão nojenta está enganado: apareceu fazendo salamaleques com o corpo escorregadio para chamar a atenção.
A noite estava toda iluminada por milhares de vaga-lumes, pela lua silenciosa e pelas estrelas úmidas. Quanto à orquestra, fiquem certos de que era da melhor qualidade: uma turma de tucanos encarregou-se de tocar em valsa os mais belos grunhidos da mata.
A bicharada estava acesa de alegria. O papagaio foi muito aplaudido quando berrou uma canção alegre, e as macacas casadoiras, penduradas pelos rabos nas árvores, estavam certas de que eram grandes bailarinas.
Bem, a coisa estava no máximo de animação. Mas a onça estava inquieta, doida para atacar. E como não fosse permitida nessa noite a carnificina, ela começou a ser feroz com a língua viperina. Então cantou: “Dona Anita é gorda roliça que nem uma porca e tem cor de rato”. A anta danou-se e retirou-se.
A onça, vendo que tinha tido sucesso, cantou uma ofensa horrível contra o jabuti, dizendo que este estava coberto de mosca varejeira. Tanto que o jabuti, ofendido, foi embora. Depois a onça falou: “Vejam que decote indecente o das filhas do macaco”. As macacas ficaram fulas da vida e só não saíram de lá porque a esperança de arranjar noivo é a última que acaba.
Mas acontece que havia entre os animais o deus dos veados. Arapuá-Tupana, que resolveu acabar com a empáfia da onça e para vencê-la pôs-se a cantar. Os bichos, sabendo que quando o ouvissem morreriam, taparam os ouvidos. Arapuá-Tupana afinal foi embora e a bicharada não morreu.
É. Mas os animais haviam perdido o dom da fala, ninguém se compreendia mais. E isso até o dia de hoje. Porque grunhir ou cantar não diz nada. Tudo por causa da onça linguaruda.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M2U7T15
A criação e a culpa
Mário Prata
Por que a culpa?
É o que eu tenho perguntado ao meu psicanalista de plantão.
No princípio era o verbo e eu achava que só eu me sentia culpado. Com o passar do tempo (e da verba) fui descobrindo que todo criador tem culpa. Não no cartório. Mas na consciência.
Vou tentar explicar.
Todo mundo acha que a pessoa que vive de criar, ou seja, um criador, não faz porra nenhuma o dia inteiro. Fica só pensando. É verdade. O problema é que ninguém considera o trabalho de pensar como trabalho. Daí a culpa ensimesmada. Será que só pode ser considerado trabalhador o sujeito que fica o dia inteiro numa mesa de escritório, ouvindo pela janela "olha a uva de Atibaia", "melancia barata, melancia barata"?
Você vê uma frase num out-door tipo "isso é que é". São quatro palavrinhas mágicas. O sujeito que inventou isso deve ganhar uma fortuna por mês. O que ninguém entende é que ele trabalha há vinte neste ofício. Pode ser que a frase tenha saído de um estalo. Mas um estalo vinte anos depois. Não precisa ser nenhuma brastemp para se ter uma idéia dessas. Ou precisa? Mas o povo pensa: ganhar essa fortuna para escrever uma bobagem dessas?
Cada vez que lanço um livro, estréio uma peça de teatro ou vou ao cinema ver um filme com roteiro meu, me dá pânico. Fico pensando: o pessoal vai pensar que eu escrevi isso na maior moleza. Que eu sou um vagabundo. E eu, realmente, fico achando que sou? Algumas mulheres trabalhadeiras já me jogaram isso na cara. E tome divã!
As crônicas, por exemplo. Escrevo uma vez por semana no Estadão e ganho mais que muitos coleguinhas que dão duro lá o dia inteiro e ainda fazem, de vez em quando, um plantãozinho de fim de semana. Fico com culpa. Sei que não devia, mas fico.
Para aliviar meu sofrimento, penso no Romário que "trabalha" umas doze horas por mês e ganha 100 mil dólares. Será que ele tem culpa? O Chico Buarque, que fica meses sem trabalhar, jogando futebol, será que ele acorda com culpa, vendo, todo dia, a sua mulher sair cedo e dar um duro danado no cinema, na televisão e ainda, de noite, fazendo um teatrinho?
Vou almoçar no Pé Prafora e quase emendo com o fim do dia. Bebendo cerveja. Mas pensando. Pensando nessas besteiras que vocês estão a ler agora. Depois, no fim do mês, vou receber a grana de um simpático funcionário que deve - com certeza - ganhar menos do que eu para trabalhar ali, o mês inteiro. Fazendo o meu cheque. Não tem jeito de não bater a culpa.
Fico pensando em Deus, que só trabalhou seis dias e tirou o sétimo para descansar. Mentira dele. Descansou o resto da vida. Ou você conhece mais algum trabalho dele nesses anos todos? Deve andar culpadíssimo. Mesmo porque, na hora de enfrentar o batente mesmo e apanhar na cara, mandou o filho. Este sim, trabalhou, deu duro e morreu pobre.
Eu, pelo menos, trabalho. Penso, invento, crio. E esses funcionários fantasmas, que trabalham em várias repartições e nunca comparecem? Será que eles não têm culpa? Será que só eu me sinto culpado neste país?
Uma vez perguntei para o Chico Buarque, que acabava de acordar às duas da tarde, se ele não tinha culpa. "Já tive. Superei". E o Caetano Veloso que nunca acorda antes das quatro (da tarde)?
Conta uma lendas que quando Einstein esteve no Brasil foi recepcionado pelo Austregésilo de Athayde. O imortal andava com um caderninho para ir anotando as idéias para seus livros e ensaios. Perguntou se o genial Eistein não fazia o mesmo. No que ele respondeu: "Não. Só tive uma idéia na vida". E o pior, é que essa idéia tinha só três letrinhas. Aquela famosa língua dele para fora denota um certo sinal de culpa. Deve ter morrido, relativamente, cheio de culpas.
Quanto menos escrevo e mais ganho, vou me sentindo, cada vez mais, subdesenvolvido e comunista. Quando deveria ser o contrário, como afirma o meu psiquiatra. Ele, por exemplo, não sente culpa nenhuma de ficar ouvindo os meus lamentos entre um bocejo e outro. Ou será que tem? Jamais saberei lidar com a culpa dele. Basta a minha.
Isso é que é!
Ei! Tem alguém aí?
Jostein Gaarder*
Ele se inclinou bem para frente, fazendo uma reverência. […] Perguntei:
“Por que você está se inclinando?’”
“Lá de onde eu venho”, explicou ele, “nós sempre fazemos alguma reverência, quando alguém faz uma pergunta fascinante. E quanto mais profunda for a pergunta, mais profundamente a gente se inclina.”
[…] a resposta me impressionou tanto que fiz uma profunda reverência, me inclinando ao máximo.
“Por que você me fez uma reverência?”, perguntou ele, num tom quase ofendido.
“Porque você deu uma resposta superinteligente para minha pergunta”, respondi.
Daí, numa voz bem alta e clara, ele disse algo que eu haveria de lembrar para o resto davida:
“Uma resposta nunca merece uma reverência. Mesmo que for inteligente e correta, nem assim você deve se curvar para ela. […] Quando você se inclina, dá passagem. […] E a gente nunca deve dar passagem para uma resposta. […] A resposta é sempre um trecho do caminho que está atrás de você. Só a pergunta pode apontar o caminho para frente”.
Achei que havia tanta sabedoria nas suas palavras, que precisei segurar bem firme meu queixo para não fazer outra reverência.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M2U2T3
Isto
Fernando Pessoa*
Dizem que finjo ou minto
Tudo que escrevo. Não.
Eu simplesmente sinto
Com a imaginação.
Não uso o coração.
Tudo o que sonho ou passo,
Ou que me falha ou finda,
É como que um terraço
Sobre outra coisa ainda.
Essa coisa é que é linda.
Por isso escrevo em meio
Do que não está ao pé,
Livre do meu enleio,
Sério do que não é.
Sentir? Sinta quem lê!
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M2U2T2
Bar Memória
Carlos Heitor Cony
Era um botequim feio, muito feio mesmo. Três portas esquálidas, paredes encardidas, balcão sórdido com empadas sinistras, d e longe se adivinhavam o mofo, as sombras, o vago cheiro de túmulo. O nome o salvava: Bar Memória. Nome inexplicável: o botequim nem merecia a classificação de bar. E por que memória? Quem nele se lembraria de alguém ou de alguma coisa? Pior: a quem dele se lembraria?
Sua importância era topográfica. Ficava numa terra-de-ninguém da cidade-cidade que cada vez mais se tornou terra de ninguém. Para os Correios e Telégrafos, o Bar Memória ficava no Jardim Botânico. Para os tributos estaduais e municipais, ficava na Gávea. Para a Receita Federal ficava. Policialmente, pertencia à 16ª Delegacia, do Leblon. Para o Corpo de Bombeiros, era o Jóquei. O Tribunal Regional Eleitoral o alistou como reserva democrática do Horto.
Sem sair do lugar, flutuando no chão da cidade, ele existia sem existir, escombro de um fantasma que não pertencia especificamente a nada e a ninguém. O Espaço imponderável, um assassinato ali cometido, com um bom advogado a favor do criminoso, jamais seria punido: faltaria. A localização exata para determinar o local do crime.
Estava sempre vazio, nunca vi luz que aliviasse sua penumbra. À noite, ele continuava fiel à escuridão, duas ou três Lâmpadas empoeiradas não iluminavam as paredes encardidas e tristes. A luz, trêmula e fria, tornava mais pesadas suas sombras.
Pois o Bar Memória foi abaixo, esta semana, Nos jornais, a foto conseguia transmitir sua solidão de bar, sua escuridão de memória. A escavadeira do município rasgou sua carne cansada, estralhaçou seu ventre de trevas. O Bar Memória se desmanchou sem resistência, sem dar um grito.
E como seu chão era imponderável, ele continuará imponderável. Ficará intacto no meio da nova pista que dará acesso à Barra. Não deixará saudade. Não deixará memória, o Bar Memória.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M3
A primeira cartilha*
Moacyr Scliar *
Há coisas que a gente não esquece: a primeira namorada, a primeira professora, a primeira cartilha. Minha introdução às letras foi feita através de um livrinho chamado Queres ler? ( assim mesmo, com ponto de interrogação). Era um clássico, embora clássico, embora tivesse alguns problemas, em primeiro lugar, tratava-se de um livro uruguaio, traduzido (o que era, e é um vexame, cartilhas, Pelo menos, deveriam ser nacionais). Em segundo lugar, era uma obra aberta e indiscreta, trazia introduções pormenorizadas sobre a maneira pela qual os professores deveriam usar o livro com os alunos. Quer dizer: era, também, para os professores, uma cartilha, o que, se não chegava a solapar a imagem dos mestres, pelo menos os colocava em relativo pé de igualdade com os alunos (pé de igualdade, não; menos. Pé de página, e em letras bem pequenas). Isto talvez fosse benéfico, porque um estímulo tínhamos par aprender a ler: ansiávamos pra descobrir os segredos dos mestres.
Em terceiro lugar – mais isto era grave -, a cartilha começa com a palavra uva. Com a palavra só, não havia uma ilustração mostrando um grande, suculento, lascivo cacho de uvas (estrangeiras, naturalmente). Era um suplicio olhar aquelas uvas (aliás, à época, uva designava, e não por acaso, uma dona boa). Principalmente para os alunos mais pobres cujo único contato com o fruto da videira era exatamente através daquela figura.
Bem, mas não é isto o que importa. O que importa é que aquele era o nosso primeiro livro, o livro que carregávamos com orgulho em nossa pasta. E o que importa, também é que esse livro, o livro que mais esqueceríamos, tinha um nome provocadoramente amável: ele não ordenava, ele perguntava; ele não só perguntava, ele convidava. E não sei de que outra maneira se possa introduzir uma criança à leitura, se não através de um sedutor convite. Porque ler é que um ato da vontade. Diante da TV se pode ficar passivo, absorvendo imagem e sons. A TV não indaga, ela se impõe. E pode se impor por causa da força de uma tecnologia que é absolutamente totalitária: do universo eletrônico no qual vivemos ninguém escapa.
Ler, não Ler exige esforço, No mundo da leitura só se entra pagando ingresso.
Decodificar as letras transformá-las em imagens é uma arte, como é uma arte tocar um instrumento musical. Mas que entram no mundo da leitura, aqueles que a eles são bem conduzidos, estes encontram nos livros um lar, uma pátria, o território dos sonhos e da emoções.
Queres ler? – pergunto a meu filho, e espero que a resposta dele seja afirmativa. Para que ele possa provar a uva da qual é feito o doce vinho da fantasia arrebatadora.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M3
Retrato em branco e preto
Tom Jobim e Chico Buarque*
Já conheço os passos dessa estrada
Sei que não vai dar em nada
Seus segredos sei de cor
Já conheço as pedras do caminho
E sei também que ali sozinho
Eu vou ficar tanto pior
O que é que eu posso contra o encanto
Desse amor que eu nego tanto
Evito tanto
E que no entanto
Volta sempre a enfeitiçar
Com seus mesmos tristes, velhos fatos
Que num álbum de retratos
Eu teimo em colecionar
Lá vou eu, de novo como um tolo
Procurar o desconsolo
Que cansei de conhecer
Novos dias tristes, noites claras
Versos cartas, minha cara
Ainda volto a lhe escrever
Para lhe dizer que isso é pecado
Eu trago o peito tão marcado
De lembranças do passado
E você sabe a razão
Vou colecionar mais um soneto
Outro retrato em branco e preto
A maltratar meu coração
* Ed. Musical Arlequim Ltda, 1968.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M2U6T3
Não sabia que era preciso
José Saramago*
Ao contrário do que afirmam os ingênuos (todos o somos uma vez por outra), não basta dizer a verdade. De pouco ela servirá ao trato das pessoas se não for crível, e talvez até devesse ser essa a sua primeira qualidade. A verdade é apenas meio caminho, a outra metade chama-se credibilidade. Por isso há mentiras que assam por verdades, e verdades que são tidas por mentiras.
Esta introdução, pelo seu tom de sermão da quaresma, prometeria uma grave e aguda definição de verdades relativamente absolutas e de mentiras bsolutamente relativas. Não é tal. É apenas um modo de me sangrar em saúde, de esquivar acusações, pois, desde já o anuncio, a verdade que hoje trago não é crível. Ora vejamos se isto é história para acreditar.
O caso passa-se num sanatório. Abro um parêntese: o escritor português que escolhesse para tema de um romance a vida de sanatório, talvez não viesse a escrever A montanha mágica ou O pavilhão dos cancerosos, mas deixaria um documento que nos afastaria da interminável ruminação de dois ou três assuntos erótico-sentimentalo-burgueses. Adiante, porém, que esta crônica não é lugar de torneios ou justas literárias. Aqui só se fala de simplezas quotidianas, pequenos acontecimentos, leves fantasias – e hoje, para variar, de verdades que parecem mentiras. (Verdade, por exemplo, é o doente que entrava para o chuveiro, punha a água a correr, e não se lavava. Durante meses e meses não se lavou. E outras verdades igualmente sujas, rasteiras, monótonas, degradantes.)
Mas vamos à história. Lá no sanatório, dizia-me aquele amigo, havia um doente, homem de uns cinqüenta anos, que tinha grande dificuldade em andar. A doença pulmonar de que padecia nada tinha que ver com o sofrimento que lhe arrepanhava a cara toda, nem com os suspiros de dor, nem com os trejeitos do corpo. Um dia até apareceu com duas bengalas toscas, a que se amparava, como um inválido. Mas sempre em ais, em gemidos, a queixar-se dos pés, que aquilo era um martírio, que já não podia agüentar.
O meu amigo deu-lhe o óbvio conselho: mostrasse os pés ao médico, talvez fosse
reumatismo. O outro abanava a cabeça, quase a chorar, cheio de dó de si mesmo, como se pedisse colo. Então o meu amigo, que lá tinha as suas caladas amarguras e com elas vivia, impacientou-se e foi áspero. A atitude deu resultado. Daí a dois dias, o doente dos pés chamou-o e anunciou-lhe que ia mostrá-los ao médico. Mas que antes disso gostaria que o seu bom conselheiro os visse.
E mostrou. As unhas, amarelas, encurvavam-se para baixo, contornavam a cabeça dos dedos e prolongavam-se para dentro, como biqueiras ou dedais córneos. O espetáculo metia nojo, revolvia o estômago. E quando perguntaram a este homem adulto por que não cortava ele as unhas, que o mal era só esse, respondeu: “Não sabia que era preciso”.
As unhas foram cortadas. Cortadas a alicate. Entre elas e cascos de animais a diferença não era grande. No fim de contas (pois não é verdade?), é preciso muito trabalho para manter as diferenças todas, para alargá-las aos poucos, a ver se a gente atinge enfim a humanidade.
Mas de repente acontece uma coisa destas, e vemo-nos diante de um nosso semelhante que não sabe que é preciso defendermo-nos todos os dias da degradação. E neste momento não é em unhas que estou a pensar.
* A bagagem do viajante . São Paulo, Companhia das Letras, 1996.
Fonte: MEC. Ministério da Educação. Programa de Formação de Professores Alfabetizadores - PROFA. Coletânea de Textos M2U6T1
"O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim, esquenta e esfria, aperta e depois afrouxa, aquieta e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem."
(João Guimarães Rosa)
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ResponderExcluirFalar sobre Temporalidade e Formação particularmente foi pra mim um pouco complexo, pois tive que procurar nos meus "alfarrábios" até que consegui encontrar e compreender um pouco melhor esta questão.
ResponderExcluirAté porque as expressoes "Esquizocronia e Cronosformação" são novas e até então eram desconhecidas pra mim.
Tive que discutir e estudar também um pouco mais com a Cilene pra que pudesse compreender melhor.
Bem na verdade nós somos e vivemos uma Esquizocronia, onde realmente não arranjamos e nem temos tempo pra nada(haja visto nossas atribuições).
Ou será que temos e não sabemos nos organizar?
Entra aqui a Teoria da Cronosformação, que compreendo que deva ser as "Organizações dos Tempos Escolares".
Se formos levar agora pra nossa realidade compreendo que sejam os chamados "Intertíscios" ou seja os intervalos dos tempos escolares, pois o que observamos é que em nossas escolas não há essa Cronosformação.
Vejamos um prático exemplo:
Existem as festas da Páscoa, do dia do indio, do Carnaval, do soldado, do folclore, da independencia, da proclamaçao, do livro infantil, do natal....
Uma infindável datas comemorativas mensais sem uma ligaçao entre si e por vezes sem fundamentação com a sala de aula com os conteúdos abordados.
Em resumo não há um Equilíbrio, que possa articular com o sentido da temporalidade, do ritmo, das formações, das aprendizagens.
Isto infelizmente ainda é muito presente e uma grande dificuldade que temos que vencer em nós mesmos enquanto formadores e depois em nossas escolas.
Quando li a teoria da transformação me vi imenso nessa trama complexa que é o tempo. Hoje não quero me tornar esquizofrenica com tantas tarefas a cumprie ao mesmo tempo mas então, tento buscar a direção do vetor fazendo articulação do tempo nos seus vários sentidos. Estamos sempre reclamando do fator tempo e as vezes falamos tanto que até perdemos tempo, não sei se me entendem...então dentro do limite de horas que disponho quero criar disciplina, que no meu entendimento é o que o texto chama de cronosformação (tempo aliado do nosso agir). Vou refletir mais sobre o este assunto e revisitar o blog outra vez.
ResponderExcluirOs conceitos cronosformação e esquizocronia do autor Gaston Pineau, são novos para mim, acho interessante estudar mais sobre esse Tema (Temporabilidades na Formação). A cronosformação significa a formação permanente que é inerente à evolução do ser humano e que envolve ritmo, estilo, contextos e necessidades de cada pessoa. Esse processo de formação requer organização e disponibilidade do tempo para estudo. Segundo o autor, depende da própria pessoa e de sua relação consigo mesma, com o outro e com o meio que a circunda.” É evidente que a temporalidade na Formação está relacionada com o SER/individual e o SER/coletivo, ou seja, a minha formação reflete na formação do outro e vice-versa. Refletindo sobre minha atuação como Formadora na Expertise e cursista na Formação do Formador Ecoar (Blog) vejo que necessito avançar em relação à otimização do tempo, objetividade e na definição das prioridades. Tem um autor (não lembro o nome, agora) que trabalha com a Administração do Tempo. Ele diz que ninguém dispõe de mais de 24h por dia, todos nós temos 24h/dia, nem mais nem menos. Saber administrar o nosso tempo implica em elencar prioridades, na seguinte ordem: 1- o que é importante e urgente e; 3- urgente e nem tão importantes; 3- importante, mas não urgente; 4- as outras ações menos importantes 5- as que você pode delegar a outras pessoas ou simplesmente, ignorá-las. Tenho consciência que aprender a administrar MELHOR o meu tempo, mas também não tenho pretensão em adquirir uma ESQUIZOCRONIA.
ResponderExcluirRenato, Vania e Vera bom refletir sobre o tempo. Este ano incluímos essa dimensão na formação da expertise, é o calendário que sinaliza o tempo, o tempo de aprender, nosso, do professor, das crianças. Não o tempo da desculpa, da esquizofrenia. Mas o Tempo aliado, formador, de oportunidade, da alma, tempo plural, das possibilidades, do fazer, do processo, o tempo que nos apropriamos, vivendo, aprendendo, agindo, o tempo em que construímos a história das aprendizagens. Bom vê-lo assim.
ResponderExcluirGostei muito desta temática a respeito do tempo. fiz a leitura a alguns dias mais senti a necessidade de refletir um pouco mais a respeito do tema antes de realizar a postagem. Nas minhas reflexões lembrei de de alguns textos, como “a teoria do caos” de Prigogine, “a teoria geral da relatividade” de Einstein” ou até mesmo “o pensamento sistêmico” em “o ponto de mutação” de Capra, todos estes abordando ideias envolvendo epistemologia e temporalidade. Desta forma apresento minhas considerações que não imutaveis, pois me refiro a este momento, amanhã pode ser que não concorde mais com estas minhas palavras: nós vivemos ao mesmo tempo a Esquizocronia e a Cronosformação, e fico feliz por isso pois assim como o tempo é relativo, a Esquizocronia tambem é relativa pois depende do ponto de vista de cada um.
ResponderExcluirdiscordo do texto, quando diz que “existem tantos tempos quanto seres”, pois na minha humilde opinião “existem mais tempos que seres” porque cada ser é multi-temporal, temos tempo para tudo e achamos que o tempo nunca é suficiente. Temos ou tivemos tempo para brincar, namorar, estudar, viajar, assistir um filme, trabalhar e até mesmo não quer fazer nada. Fico satisfeito que temos ou tivemos tempo para viver tudo isso ao contrário do que diz a música “epitáfo” dos titãs
“Devia ter amado mais
Ter chorado mais
Ter visto o sol nascer
Devia ter arriscado mais
E até errado mais
Ter feito o que eu queria fazer...”
certamente, quem pensa assim é ou foi muito infeliz.
De certa forma, pensando no objetivo geral do projeto Expertise em Alfabetização que é alfabetizar 100% das crianças do CI 1°ano, um ano parece muito tempo mais quando percebemos que um ano tem 365 dias e temos 200 dias letivos menos os dias enforcados os dias paralisados nos restando por volta de 180 dias letivos efetivos e um processo de 4 níveis da psicogênese a ser perpassado nos deparamos com apenas 45 dias para cada nível e então percebemos o tempo que antes era amplo agora se reduz. por isso não podemos “esperar na pura espera, pois quem espera na pura espera tem um tempo de espera vã” (Paulo Freire) devemos valorizar nosso tempo de trabalho na busca do equilíbrio kayrós proposto no texto.
O comentário feito pelo colega Elienae e o diálogo sobre o tempo com Lorena , me levou a pensar sobre a relatividade do tempo e seus determinantes, que acredito dependerem de desejos e escolhas de cada um. Daí a importância de refletir com nossos colegas de profissão, a respeito da cronosformação, em como tornar o tempo nosso aliado, para que juntos possamos redimensionar o tempo de aprender, sem perder de vista que ele é também um tempo de viver. E que para tanto, o compromisso com uma educação de qualidade - o qual está intimamente relacionado ao querer fazer/desejo – deve ter importância e urgência, na vida de cada professor, como citou a colega Vera.
ResponderExcluirGostei muito dos comentários do Elienae, traz até música:qt interlocução!, e da Marta quando fala da urgência. Ambos remetem as ações que realizamos. As coisas precisam acontecer. Sobretudo as aprendizagens que nos ocupamos no projeto expertise. E o tempo é a energia vital para que ela ocorra. Quando o tempo acaba é a morte, quando morremos deixamos de aprender. O tempo de viver, o tempo de aprender. Isso que nos nutre, alimenta, sustenta, nos mantém vivos. Devemos fazer boas escolhas e usar nosso precioso tempo com ações produtivas, que realmente valham a pena, para não vivermos em vão, como lembrou Elienae.
ResponderExcluirTodos nós devemos ou pelo menos deveríamos ser em algum momento senhores e semhoras do nosso tempo. Realmente é "Tempo de Aprender", não deixemos passar este momento.
ResponderExcluirFantástica essa teoria sobre o tempo, também como meus colegas não tinha conhecimento sobre o assunto "Esquizocronia e Cronosformação". Relacionando com minha recente experiência no grupo refleti que no primeiro dia, e pensei como terei tanto tempo para realizar tantas atividades?. Nossa vida e nossas ações estão sempre pautadas no "Senhor Tempo". Tempo pra estudar, para desenvolver atividades caseiras e como administrar tantas atividades em tão pouco?
ResponderExcluirApesar de ignorar tal teoria sempre pensei muito a respeito da temporalidade e estou de acordo com Renato, quando diz que nas escolas não conseguimos otimizar o tempo escolares com as crianças, visto uma série de atividades que ocorrem atreladas a aprendizagem dos alunos, que se não forem bem administradas podem dificultar a aprendizagem. Então temos que ter sabedoria e organizar nossa vida não em função do tempo e sim em função da vida, do que é saudável.
Mutas pessoas dizem e algumas vezes penso também que o dia deveria ter mais de 24h e reflito se tivesse sem dúvida eu iria acumular mais atividades. E chego a conclusão "tem tempo pra tudo" o importante é você saber viver seu tempo.
Sua escrita, Rita, mostra o seu estado de aprendência que exige: autoposicionamento, questionamento e avaliação. Lindo como vc articula processos internos e externos, vivido por vc e pelos outros. O que revela uma postura Transdisciplinar, sabia?
ResponderExcluirOs slides tratam da cronosformação que é uma formação a respeito do tempo, isto porque é necessário que estejamos conscientes das distintas dimensões da temporalidade, bem como da influência dessas distintas dimensões em nossa vida cotidiana. Podemos ter, por exemplo: o tempo físico e nossas limitações; o tempo emocional e tudo que nos move; o tempo afetivo e nossas relações com as pessoas que então em nosso entorno; o tempo da alma e nosso equilíbrio espiritual; o tempo virtual e o leque de opções que a rede possibilita quanto aos acessos à informação; o tempo de aprender e as limitações presentes durante deste período de aprendizagem; o tempo de estudar; o tempo de avaliar; o tempo de reavaliar nossas posturas e modos de atuar juntos aos professores e alunos, enfim, são muitas as dimensões do tempo e precisamos ter consciência de todas elas para que possamos administrar melhor nossos tempos para não ficarmos queixando-nos da falta de tempo.
ResponderExcluirValéria Risuenho
Hoje quando realizei uma nova leitura sobre o texto compreendi melhor o tema, pois a cronosformação é um tema novo e requer um estudo mais atento. Percebo que nossos professores não possuem ainda esse entendimento, nossas escolas públicas estão ainda em processo de construção da qualificação do tempo de aprendizagem. Na verdade se construiu uma cultura de aproveitar o tempo para descansar e não produzir ações mais significativas. Enquanto ser humano temos que saber articular e administrar nosso tempo de forma a ter saúde mental, um tempo muito ocioso causa depressão, um tempo bastante comprometido com muitas atividades causa estafa. Então, como administrar de forma produtiva? Sabendo selecionar as prioridades e fazendo aquilo que te dar prazer, nada que é imposto sai produtivo, temos que ter metas caso contrário não teremos resultados satisfatórios. É isso que se faz necessário ainda aprender muito enquanto formadores para saber formar professores também articulados de forma produtiva com o tempo de aprendizagem dos alunos. Assim teremos uma escola também mais produtiva.
ResponderExcluirEsta temática é bastante pertinente, uma que a nossa vida esta gerida por um tempo que graças ao Nosso Bom Deus não sabemos quando este tempo pode se extinguir,por isso devemos aproveitar todas as oportunidade que temos nas 24h de todos os dias para crecermos e evoluimos, penso que desta mesma maneira o tempo de aprender dos alunos deve ser aproveitado da melhor maneira possivel, não podemos pemitir que as crianças sejam ludibriadas neste direito que é seu, portanto, devemos orientar os professores para fazer valer este direito. A utilização do tempo de aprender vai oportunizar as crianças avanços e conquistas que em outros momento fora da escola estas não teem.
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